terça-feira, 12 de janeiro de 2016

MORTALIDADE





















Veja os rostos na névoa,
as expressões de outrora,
todas sombras do tempo,
marcas no pensamento.

O passado não se foi,
ele existe na recordação,
ele resiste e insiste,
abriga-se fundo no coração.

A saudade viaja momentos,
visita lugares e pessoas,
supera a inexistência,
invade as lacunas da morte.

Um sonho se forma,
num reencontro se torna,
num irresistível delírio
logo sufocado pelo amanhã.

Veja de novo os seus olhos,
ouça agora as suas vozes,
mas o passado distante não
o escutará nem o verá clamar.

Somos jovens no tempo,
mas estamos avelhantados,
todos nos sentimos vivos,
mas estamos perecendo.

Seremos o passado amanhã,
e o amanhã também o será,
como flores que abrolham
para depressa emurchecer.


Lucas O. Ornaghi

domingo, 11 de outubro de 2015

EVOCAÇÕES DA ALMA POÉTICA














Acorda-me o meu espírito inquieto,
à luz vinda da janela eu escrevo,
e meu coração está cheio, como
um copo prestes a transbordar.

Derramam-se meus pensamentos,
evocações de uma alma poética,
devaneios sobre os tempos,
de dias que se foram e que virão.

Tão-só a chuva e a aura falam,
com uma fala mansa e delicada
levam paz à solitude dessa noite,
mas me rememoram momentos.

Eu sei que já estive agrilhoado,
um cativo dentro da minha psique,
comprimido e aflito, em silêncio,
sentindo-me vazio, só e alienado.

Foram tempos sombrios de outrora,
o que devo vivenciar é o agora,
preciso abraçar a vinda da aurora,
permitir os temores irem embora.

Não escrevo tanto quanto antes,
talvez minha poesia esteja doente,
talvez os versos jazam distantes,
mas não vou deixar de ir em frente.

Pode o poeta durar eternamente?
Podem a chuva, a aura e a noite?
Pode a poesia ser esquecida?
Podem a lua e as estrelas?

A vida é feita de idas e vindas,
de encontros e desencontros,
e o que permanecem são palavras,
um legado de ideias e momentos.

Eu sei que essa noite se ultimará
e esse poema também findará,
com saudade alguém lembrará,
mas agora um poeta se despedirá.

Lucas O. Ornaghi

sexta-feira, 20 de março de 2015

A NOVA ALVORADA DA POESIA












Sonhei com um mundo sem poesia,
aterrorizei-me com uma vida vazia,
adoeci em meio à tamanha apatia.

Estavam todos mortos ao meu lado,
não havia verso a ser compartilhado,
o terror estava sendo decretado.

Um deserto foi o que remanesceu,
apenas a ignorância nele madureceu,
razão e fantasia, tudo se perdeu.

As traças nossos livros corroeram,
gafanhotos também apareceram
e um mundo de ideias eles varreram.

Aquele mundo sem a poesia ruíra,
a massa em agonia se revolvia,
todavia, nada aos tolos comovia.

Mas cada poeta virou um peregrino
que nas sombras afastava o Malino,
erguendo a poesia como ensino.

A marcha final apenas começara,
a liberdade de longe se avistara
e nova alvorada para a poesia raiara.


Lucas O. Ornaghi

quinta-feira, 1 de janeiro de 2015

OLHOS NA ESCURIDÃO















Sinto o ar do sereno da noite,
noite esta de silêncio e paz,
noite de meditação para mim.

A cidade jaz adormecida agora,
todos sonham e repousam,
mas eu aguardo na escuridão.

Eu espero por mim mesmo,
eu espero pela minha alma,
eu almejo a voz do coração.

Na quietude da noite eu ouço,
venho a escutar com clareza,
achego-me mais a quem sou.

A psique fala sobre ambição,
ela me conta ideias e fantasias,
e também me expõe a verdade.

Lanço um suspiro ao refletir,
ao idear o que o tempo reserva,
ao supor quem serei amanhã.

Há tantos planos e aspirações,
há tanto pelo que se empenhar,
mas o tempo é o da realidade.

Olho o céu sombrio pela janela,
fecho os olhos numa prece e
abrando a minha tempestade.

Abro os olhos na escuridão,
vejo que agora sei quem sou,
sei o que escolhi me tornar.

Fecho os olhos na escuridão,
aquieta-se enfim meu espírito,
une-se meu sono ao da cidade.


Lucas O. Ornaghi

terça-feira, 14 de outubro de 2014

VIL ALTAR


















Uma presença infesta chega para molestar,
concebe pesadelos capazes de terrificar,
evoca espectros a cada acre despertar,
reminiscências que renascem para derrubar.

Torna-se difícil a liberdade poder respirar
quando olhos alheios fixam-se para acusar,
almeja-se a morte como meio de se libertar
da culpa e do medo que vêm para martirizar.

O semblante no espelho carrega um olhar
de agonia e solidão capazes de devastar,
olhos pagãos que não se deixam enganar
pelos que querem condenar para daí expiar.

Pode um mundo tão grande pequeno ficar?
Podem quatro paredes alguém sufocar?
Vão as cicatrizes para sempre durar?
Estão as angústias d’alma num vil altar?

Confrontar os demônios pode assustar,
mas é preciso parar de nas trevas caminhar,
abrir as cortinas da mente pode alumiar
e não há o que a luz não possa subjugar.


Lucas O. Ornaghi

quinta-feira, 21 de agosto de 2014

PENSAMENTOS















Não há amigos, não há estranhos,
não se vê ninguém e ainda assim
não há solidão nem abandono.

Não há grades, não há paredes,
não há correntes e ainda assim
não há escape nem liberdade.

Não há palavras, não há ruídos,
não se ouve nada e ainda assim
não há paz nem silêncio.

O dia passou, a noite passou,
o tempo passou e ainda assim
não há sono nem despertar.

O que há são pensamentos...

Lucas O. Ornaghi

sábado, 21 de junho de 2014

A CAMINHO DO SOL














Estamos todos a caminho do Sol.
Rogamos: Venha! Abrasa-nos!
Transforma-nos ou dizima-nos!
Refina-nos ou derreta-nos!

Em agonia invocamos às chamas:
Consuma-nos rápido!
Desgostosos clamamos ao vento:
Dissipe-nos ao oblívio!

É algo brutal, insano, primitivo,
eclode violentamente, arde como
como a cólera de um incêndio.

Idolatramos e execramos a nós
mesmos. Medo e desesperança
nos movem à autodestruição.

Espalha-se a devoção ao ego, e a
mentira ganha espaço num mundo
frágil e devastado por si mesmo.

Não há simpatia pelos bons – há
ódio e há aviltamento. A justiça
se tornou uma história de lamento.

Cai a noite alertando os que são
livres para correr – que o façam,
pois regressa a Idade das Trevas.

Não há sequer uma gota de razão,
as fontes borbulham areia, e a
alvorada revela os seus mortos.

O mundo carrega a liberdade em
suas garras e a arrasta para o ermo
inóspito da alienação.

O verme aguarda ansioso pela
podridão, ri-se do genocídio e da
tolice na qual se empenham nações.

Tínhamos a benção. Escolhemos a
maldição, pois dissemos: Somos
os filhos do átomo! Amanhã
seremos a poeira das estrelas.

No caminho gritam aves de rapina:
Caiam! Desistam! Entreguem-se!
Gritam mais alto as pombas:
Ergam-se! Persistam! Completem!


Lucas O. Ornaghi

terça-feira, 4 de março de 2014

POESIA












Chega a noite, a escuridão e o silêncio,
a chuva, o vento e um pensamento, e
estou a dormir e sonhar num momento.

A hora é tardia e cada vez mais sombria,
a noite que cai segue calada e muito fria,
um pensamento vem e não se silencia.

O medo e o prazer aqui se encontram,
o meu ódio e minha paixão se inflamam,
o desespero e a serenidade se afrontam.

O devaneio brinca com ideias perigosas,
estimula as fantasias mais audaciosas,
sussurra palavras traiçoeiras e ruinosas.

Mas em transe estou e preciso escrever,
tão singulares coisas tenho a descrever,
reprimidos sentimentos querem renascer. 
 
Entrego-me a forjar a nova concepção,
liberto a psique da velha percepção,
aceito na noite sombria a minha criação.


Lucas O. Ornaghi

quarta-feira, 29 de janeiro de 2014

A CÓLERA DA TEMPESTADE

Carrego n’alma a cólera da tempestade,
jaz o trovão em cada uma das palavras,
o vento conduz temerosas expectativas,
a chuva cai irrigando medrosas fantasias.

Sinto-me inconstante como é a nuvem,
que às vezes consente a estiagem,
trazendo tempo sereno após a chuva,
mas que volta com grande fereza e ruína.

Assim é o meu espírito, vil e ardiloso,
que às vezes me logra com boa ventura,
trazendo regozijo e paz em minha vida,
mas que volta com o medo e o desgosto.

Gostaria de carregar a luz em meu íntimo
para evanescer nuviosos pensamentos
e poder me desviar da estrada da morte
que confina o mundo em noite infindável.

Eu tenho procurado a beleza e a pureza,
me enlevado ao poder olhar o universo,
e saudando as estrelas e o cosmos
eu reverencio Aquele que os fez.

Quão triste é viver nessa era de escuridão,
é observar tantas expressões solitárias,
é saber que negamos a nossa origem,
é pressentir a tormenta e sua devastação.


Lucas O. Ornaghi

domingo, 13 de outubro de 2013

ESPÍRITO DA PRIMAVERA













O vento que chega carrega um lamento,
dói o choro que segue calado na alma
amargurada dos espinhos da vida.

Em cada lágrima mora um pensamento,
a doce canção compõe a consolação
e num breve momento vive a liberdade.

Não existe amor que não ocupe o vazio,
não há sorriso que não aparte as trevas
nem bondade que endureça corações.

Um navio à deriva não tem um destino,
assim como a ideia que está em inércia,
sem reação para se tornar realidade.

Saudade é pensar no que se passou,
mágoa é remoer os arrependimentos,
mas a covardia é se esquecer de viver.

Glória é provar o gosto da alvorada,
feliz é o que aprende a amar a vida e
para ele só há o espírito da primavera.


Lucas O. Ornaghi

quarta-feira, 21 de agosto de 2013

ESTRANHO



















Estranho é procurar entender aquilo que se vê,
quando antes de o mundo poder ser explicado
eu tornei-me um estranho para mim mesmo.

Acredito que o universo preserva a verdade,
e acredito que o universo também mora em
meus membros, na densa sombra da psique,
e espero por isso ser mais que carne e sangue.

Mas se a verdade mora em meu universo, por
que não consigo encontrá-la e trazê-la da
profunda escuridão para a gloriosa luz?

Olho para o meu próprio reflexo e vejo que ele
é por si mesmo parte de tudo o que eu sou e
ao mesmo tempo não sou, um retrato fresco
que está exposto sob os véus da consciência.

Acordo-me com a luz, deito-me com as trevas,
e dias e noites apenas perlongam a incerteza,
alimentam minhas percepções do indecifrável.

Não conheço o que é estranho, mas permito
que o tesouro bruto de minha alma seja
refinado por Aquele a quem nem carne ou
escuridão podem ocultar minha real essência.


Lucas O. Ornaghi 

quarta-feira, 22 de maio de 2013

DIAS DE JUVENTUDE














Cai pelo anoitecer o som da chuva afável,
inabalável chega ao coração a nostalgia,
tempo de se amar uma velha fotografia,
ocasião nobre em que recordar desafia.

O coração resgata a estação primaveril,
lembra-se de como era a mente pueril,
sorri saudosamente para aquela vaidade,
anseia restaurar a feliz simplicidade.

Lembrar-se da mocidade acalora a alma,
desperta a exaltação e também acalma,
reacende a gratidão do quê se conquistou,
mas reabre feridas da dor que cicatrizou.

O momento percorre a estrada da vida,
avança com uma passagem só de ida,
faz do presente uma futura lembrança,
e produz no espírito uma eterna criança.

A luz da aurora trouxe dias de juventude,
elevou as alegrias e beleza à magnitude,
e chegou o ocaso não para entristecer,
mas para se viver e o tempo enriquecer.


Lucas O. Ornaghi