quinta-feira, 15 de novembro de 2012

ASAS DE UM PESADELO




















Emancipe memórias, ó alma conflitante,
corra pela noite sem Lua e busque abrigo,
fuja daquele que está recluso nas trevas.

Há uma canção que vem com o ar gélido,
um convite sedutor persegue os incautos,
velas se apagam e a aldeia se estremece.

As horas mortas, as ruas vazias, o silêncio,
o medo e curiosidade pelo que não se vê,
tudo toma forma nas asas de um pesadelo.

Não se enamore das trevas, não vá ceder,
não ouça as vozes que vem pra acalentar,
pra te transformar num grito entre paredes.

Mas não escondeste bem suas fantasias,
e agora elas fugiram para te devastar,
para acordar o insano êxtase do supérfluo.

A consciência se perdeu para a emoção,
o mar a invadiu e tomou conta das praias,
a razão foi engolida pela vil tormenta.

Afogou-se em águas turvas e agitadas,
mergulhou só em profunda amargura,
tornou-se uma sombra inerme da dúvida.

Nade para a superfície e observe o céu,
veja Éolo lhe apontando para o oeste,
ice as velas da mente e volte para casa. 

Lucas O. Ornaghi

segunda-feira, 8 de outubro de 2012

ALÉM DESTE INSTANTE




















O pior do mundo está abertamente exposto,
a alma humana fartou-se de desgosto,
a agonia alastra-se pelo ar e fere cada rosto.

Olhos abrem-se nestes dias vis e sem alento,
veem realidades com grande esgotamento,
buscam se libertar das memórias no tempo.

Os homens temem ver além deste instante,
recusam confrontar um mundo perturbante,
prosseguem ignorando o amanhã avante.

Às vezes param o tempo para poder pensar,
no vazio entre sonho e realidade estacionar,
na eternidade de um instante para alucinar.

A solitude cerca, beija-os como o vil inimigo,
um falso abrigo do medo que vem para afligir,
para a pensamentos perigosos conduzir.

Falsa ideologia moderna nas ruas se externa,
é aquela que para o homem se faz eterna,
o prisioneiro da escuridão de sua caverna.

Lucas O. Ornaghi

sábado, 1 de setembro de 2012

FRUTOS PERFEITOS DA IMAGINAÇÃO

















O silêncio entoa o desgosto em
meus ouvidos, eu tento
esquecê-lo, desconhecê-lo,
sua presença perder e essa dor
muda conter.

As mãos gélidas tremem,
sentem o frio da solidão, e
caminhando pelas ruas vazias
verto lágrimas de gelo de um já
frígido coração.

Nasce dentro de mim uma
arraigada tristeza, profundo
sentimento que me causa frieza
e eu sei que não pertence à
minha natureza.

A vil insensibilidade e ingratidão
calejam meu coração, a
falsidade estampada em rostos
alheios subestima a minha
percepção.

Não exijo perfeição da prole da
imperfeição, mas gostaria que
pessoas genuínas fossem mais
do que frutos perfeitos da
imaginação. 

Lucas O. Ornaghi

segunda-feira, 20 de agosto de 2012

EPITÁFIO














Caem nas lápides do inferno lágrimas de saudade.
Antigos epitáfios enaltecem sombras da existência.

Fria esvanece a história das almas, fria como a
chuva que rega esses jardins solitários.

Mas o além não hospeda nenhum que já partiu.
Não, pois além da morte só há esperança.

Eis que ao som de cânticos após o fim dos tempos
ossos e tecidos em belos jardins se erguerão.

Caem nos jardins do paraíso lágrimas de gratidão.
Nos pátios do Altíssimo a glória se eternizou.

Lucas O. Ornaghi

sábado, 23 de junho de 2012

A PORTA DA VIDA




















Sinto medo de as coisas ficarem assim, 
não sei dizer o que está diante de mim, 
receio que o tempo me mostrará enfim. 




Imagino-me tão distinto do que sou, 
sempre me pego sem saber aonde vou, 
cada vez mais ressinto ficar onde estou. 


A vida prossegue na mesma direção, 
rumo a uma inevitável rota de colisão, 
colisão entre a rotina e o meu coração. 


Nasce dentro de mim intensa tristeza, 
sentimento esse que me causa frieza 
e sei que não pertence à minha natureza. 


De manhã me levanto dificultosamente, 
talvez cansado de sonhar e ter de o 
sonho esquecer na hora de viver. 


Mas deixarei de reclamar e me lastimar, 
enquanto o ar se puder respirar e a brisa 
o meu rosto vier docemente tocar. 


Em nossas ideias há a falsa perfeição, 
mas tudo é concebido em imperfeição, 
e tudo, além disso, não passa de ilusão. 


A beleza existirá sempre que houver 
alma para apreciá-la, sempre que um 
apaixonado pela vida decidir poetizá-la. 


Paz e liberdade pertencem ao poeta, 
quem a graça é da fonte mais seleta, 
quem a porta da vida continua aberta. 


Lucas O. Ornaghi

sexta-feira, 11 de maio de 2012

OLHOS EM TRANSE

Na sombra estou e não devo me amedrontar, 
recluso nas trevas eu aproveito para meditar, 
vejo pela janela a hora impetuosa avançar 
e anseio para longe em breve me transportar. 


Meus olhos em transe olhavam para o céu, 
contemplavam aquela noite e seu negro véu, 
meus lábios provavam o desgosto com um fel, 
espinhos na carne sangravam ideias no papel. 


Para as montanhas da lua eu então peregrinei, 
e a percorrer galáxias eu depois me ocupei, 
correndo pelo cosmo para os portais achar 
e para a língua dos anjos poder desvendar. 


Em solo estrangeiro eu ousadamente pisava, 
o Éden atrás do véu estrelado eu buscava, 
nas horas sombrias e frias da noite sem fim 
em direção ao que não conhecia eu viajava. 


Atraído para longe do tempo e suas limitações 
conheci grandeza maior que muitas invenções, 
e na calda de cometas prosseguia sem parar 
para em lugares ainda não imaginados estar. 


Chegando às profundezas da criação fui 
arremessado de volta para o quarto de  
alguém que acaba de despertar com um 
poema em suas mãos. 


Lucas O. Ornaghi

segunda-feira, 30 de abril de 2012

DESAPIEDADO



















Não sou do jeito que você me imaginou, 
não estou mais da forma como me deixou, 
não quero encontrar quem me machucou, 
não me importa se a ferida cicatrizou. 


Uma nova percepção na dor despontou, 
a sensação de viver ludibriado se tornou, 
a sofreguidão os meus nervos tomou, 
a insanidade meus delírios emancipou. 


Uma luz no pardo empíreo me alumiou, 
a chuva que ruía à minha ruína se ligou, 
ela me contou que a vida me atropelou, 
ela me lavou e a minha cólera abrandou. 


Do abismo da alma o vento me arrastou, 
a lágrima à chuva do ocaso se combinou, 
a autopiedade até agora me impregnou, 
mas sinto que já desapiedado estou. 


Não há mais Jekyll se a vida me assolou, 
nada além da vertigem que me atravessou, 
só há Hyde e a frieza que me sobrepujou 
e a divagar nas horas mortas condenou. 


Lucas O. Ornaghi

domingo, 15 de abril de 2012

A PRAIA DA MENTE


A razão mora numa concha na praia da mente,
uma ideia faz um mar revolto e inconsequente,
pensamentos impetuosos a ferem de repente.


Como ondas, a arrastam para o mar profundo,
a insanidade domina a razão num segundo,
afoga-a num obscuro e desconhecido mundo.


À deriva fica o vislumbre solitário da exultação,
tão afastado da razão e de alguma motivação,
sem saber se um sentimento dará a direção.


Não há como evitar a corrente da emoção,
a percepção se corrompe e se torna a ilusão,
trazendo equivocadas ideias à sublimação.


Às vezes a concha volta para a praia da mente,
mas a borrasca a aguarda silenciosamente
para surpreendê-la atemorizantemente.


Lucas O. Ornaghi