segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

SEM VOCÊ

Um constante pensamento deixa minha
alma abalada, minha caneta parada,
minha mente vazia e cansada. Nada.
O papel está em branco e um possível
verso logo se esvai.

Olho para o teto, abraço meu
travesseiro e tento dormir, mas como
adormecer sem a verdadeira poesia
conseguir escrever? O relógio, a fadiga,
esses não exercem mais poder. A poesia
é quem me conduz, mas entre minhas
ideias não há luz.

Minha cama se tornou como um ermo e
minha mente como uma embarcação
inerte à calmaria dos ventos. Eu quero
dormir, chego a cochilar, mas não
demora até assustado de repente
acordar, preso ao ponto de partida e
sem saber como continuar.

Silêncio e trevas invadiram meu
coração. Movo-me como as sombras,
como o vento que segue solitário
rumo a nenhum lugar, e em nenhum
lugar é onde também eu quero estar.

É de manhã. Como um seco rio o
curso da minha vida prossegue vazio,
pois satisfação em meu corpo não
mais fluiu desde que você partiu e sua
falta meu íntimo sentiu.

Não queria admitir, quem me dera
encontrar forças para resistir, para sem
você novamente sorrir, mas não sou
capaz de impedir que em minha
cabeça vulnerável tu me encontres
para seduzir.

Tinha tanto ainda a lhe dizer, não
queria tão cedo te perder. Não sei mais
o quê fazer nem como ainda hei de
viver. Rezei para te esquecer, para seu
rosto em meus sonhos nunca mais
aparecer, mas deixar de te ver fez
meus olhos lágrimas verter.

Eu tentei, mas não posso ignorar o fato
de que não consigo te fazer
desaparecer. Antes de você minha
alma enfraquecer, em meus poemas
eu conseguia imparcialmente
escrever, mas em minhas palavras
você agora insiste em permanecer.

Eternamente enraizada no
subconsciente de meu reflexivo ser é
insuportável ter de seu toque gentil
carecer, de minha mente a seu poder
submeter, sem meios de outra vida
escolher, de outra paixão deixar crescer.

Cansei de com esse conflito conviver.
Quem me dera parar de sofrer, desse
veneno que é te amar em minhas
veias manter. Quem me dera renascer
e não ter de a esse antigo amor querer
me comprometer.

Não há prazer em com as sombras do
passado sobreviver. Minha alma
suspira e não quer se render, mas o
traiçoeiro coração nunca deixa de me
surpreender quando o amanhecer os
mesmos sentimentos que me
escravizam me compele a desenvolver.

Lucas O. Ornaghi

REPENTINA COMO A BRISA

Com a aurora renascia a ávida busca de
um homem, e um dia no espelho a
avelhentada face de um estranho ele vê,
um reflexo distante e até então
desconhecido de si mesmo, mas
quando ele de novo olha, uma
indesejável familiaridade ele nota, ao
passo que repentina como a brisa se
sucede o que foi deixado para sempre
num passado já fora de seu alcance.

O tempo presente em cada momento
avança como um trem em movimento, e
a vida, feita de estradas que depois de
percorridas permanecem de nós
escondidas, transforma-se na corrida
contra o imprevisível, na busca pelo que
é capaz de preencher universos vazios
e solitários feitos de longas noites que
te sufocam e tornam como roupas
presas num armário.

Uma lágrima de seus olhos lentamente
escorre e as estruturas de sua alma
percorre. Em uma lágrima uma
reprimida tristeza se esvai e nas
páginas de um empoeirado livro que
está em suas mãos cai. Palavras
escritas seus lábios em silêncio leem, e
em sua memória lembranças de um
apaixonado jovem seus olhos com
saudade veem.

À porta de seu quarto o hálito gelado do
inverno esfria mais seu corpo a cada
incerto amanhecer, que em breve em
um sono profundo o fará adormecer.
Décadas vividas entorpecem seus
passos, embranquecem seus cabelos e
adoecem o seu corpo, mas não o
esquecem daqueles a quem ama e já
amou, daqueles a quem durante o
tempo de uma vida o acompanhou.

Distante da terra dos mendazes e dos
néscios morosamente vive os últimos
momentos de um exânime moribundo, e
penetrando pela última vez o coração
do profundo e vasto oceano seu íntimo
sensibiliza-se com a beleza poética
contemplada em mais um encarnado
pôr-do-sol, que lhe presenteia com o
enrubescer das nuvens do seu último e
mais belo ocaso.

Como ele queria que tão somente o
curso da vida fosse calmo e lento como
um navio a zarpar, desaparecendo no
longínquo do mar. Sendo agora levado
pela nortada, plangente sente ter que
deixar para sempre a borrasca, mas
ditoso se lembra que partindo
eternamente sua essência em outros
corações vai conservar, quando sua
existência terrestre então findar.

Lucas O. Ornaghi