terça-feira, 14 de outubro de 2014

VIL ALTAR


















Uma presença infesta chega para molestar,
concebe pesadelos capazes de terrificar,
evoca espectros a cada acre despertar,
reminiscências que renascem para derrubar.

Torna-se difícil a liberdade poder respirar
quando olhos alheios fixam-se para acusar,
almeja-se a morte como meio de se libertar
da culpa e do medo que vêm para martirizar.

O semblante no espelho carrega um olhar
de agonia e solidão capazes de devastar,
olhos pagãos que não se deixam enganar
pelos que querem condenar para daí expiar.

Pode um mundo tão grande pequeno ficar?
Podem quatro paredes alguém sufocar?
Vão as cicatrizes para sempre durar?
Estão as angústias d’alma num vil altar?

Confrontar os demônios pode assustar,
mas é preciso parar de nas trevas caminhar,
abrir as cortinas da mente pode alumiar
e não há o que a luz não possa subjugar.


Lucas O. Ornaghi

quinta-feira, 21 de agosto de 2014

PENSAMENTOS















Não há amigos, não há estranhos,
não se vê ninguém e ainda assim
não há solidão nem abandono.

Não há grades, não há paredes,
não há correntes e ainda assim
não há escape nem liberdade.

Não há palavras, não há ruídos,
não se ouve nada e ainda assim
não há paz nem silêncio.

O dia passou, a noite passou,
o tempo passou e ainda assim
não há sono nem despertar.

O que há são pensamentos...

Lucas O. Ornaghi

sábado, 21 de junho de 2014

A CAMINHO DO SOL














Estamos todos a caminho do Sol.
Rogamos: Venha! Abrasa-nos!
Transforma-nos ou dizima-nos!
Refina-nos ou derreta-nos!

Em agonia invocamos às chamas:
Consuma-nos rápido!
Desgostosos clamamos ao vento:
Dissipe-nos ao oblívio!

É algo brutal, insano, primitivo,
eclode violentamente, arde como
como a cólera de um incêndio.

Idolatramos e execramos a nós
mesmos. Medo e desesperança
nos movem à autodestruição.

Espalha-se a devoção ao ego, e a
mentira ganha espaço num mundo
frágil e devastado por si mesmo.

Não há simpatia pelos bons – há
ódio e há aviltamento. A justiça
se tornou uma história de lamento.

Cai a noite alertando os que são
livres para correr – que o façam,
pois regressa a Idade das Trevas.

Não há sequer uma gota de razão,
as fontes borbulham areia, e a
alvorada revela os seus mortos.

O mundo carrega a liberdade em
suas garras e a arrasta para o ermo
inóspito da alienação.

O verme aguarda ansioso pela
podridão, ri-se do genocídio e da
tolice na qual se empenham nações.

Tínhamos a benção. Escolhemos a
maldição, pois dissemos: Somos
os filhos do átomo! Amanhã
seremos a poeira das estrelas.

No caminho gritam aves de rapina:
Caiam! Desistam! Entreguem-se!
Gritam mais alto as pombas:
Ergam-se! Persistam! Completem!


Lucas O. Ornaghi

terça-feira, 4 de março de 2014

POESIA












Chega a noite, a escuridão e o silêncio,
a chuva, o vento e um pensamento, e
estou a dormir e sonhar num momento.

A hora é tardia e cada vez mais sombria,
a noite que cai segue calada e muito fria,
um pensamento vem e não se silencia.

O medo e o prazer aqui se encontram,
o meu ódio e minha paixão se inflamam,
o desespero e a serenidade se afrontam.

O devaneio brinca com ideias perigosas,
estimula as fantasias mais audaciosas,
sussurra palavras traiçoeiras e ruinosas.

Mas em transe estou e preciso escrever,
tão singulares coisas tenho a descrever,
reprimidos sentimentos querem renascer. 
 
Entrego-me a forjar a nova concepção,
liberto a psique da velha percepção,
aceito na noite sombria a minha criação.


Lucas O. Ornaghi

quarta-feira, 29 de janeiro de 2014

A CÓLERA DA TEMPESTADE

Carrego n’alma a cólera da tempestade,
jaz o trovão em cada uma das palavras,
o vento conduz temerosas expectativas,
a chuva cai irrigando medrosas fantasias.

Sinto-me inconstante como é a nuvem,
que às vezes consente a estiagem,
trazendo tempo sereno após a chuva,
mas que volta com grande fereza e ruína.

Assim é o meu espírito, vil e ardiloso,
que às vezes me logra com boa ventura,
trazendo regozijo e paz em minha vida,
mas que volta com o medo e o desgosto.

Gostaria de carregar a luz em meu íntimo
para evanescer nuviosos pensamentos
e poder me desviar da estrada da morte
que confina o mundo em noite infindável.

Eu tenho procurado a beleza e a pureza,
me enlevado ao poder olhar o universo,
e saudando as estrelas e o cosmos
eu reverencio Aquele que os fez.

Quão triste é viver nessa era de escuridão,
é observar tantas expressões solitárias,
é saber que negamos a nossa origem,
é pressentir a tormenta e sua devastação.


Lucas O. Ornaghi